CIRCULAR SECEX Nº 95, DE 29 DE DEZEMBRO DE 2008

DOU 31.12.2008


O SECRETÁRIO DE COMÉRCIO EXTERIOR DO MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO EXTERIOR, nos termos do Acordo sobre a Implementação do Artigo VI do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio - GATT 1994, aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30, de 15 de dezembro de 1994,
e promulgado pelo Decreto nº 1.355, de 30 de dezembro de 1994, de acordo com o disposto no art. 3º do Decreto nº 1.602, de 23 de agosto de 1995, e tendo em vista o que consta do Processo MDIC/SECEX/ DECOM 52100.006147/2008-44 e do Parecer nº 35, de 29 de dezembro de 2008, elaborado pelo Departamento de Defesa Comercial - DECOM desta Secretaria, e por terem sido apresentados elementos suficientes que indicam a prática de dumping nas exportações da República Popular da China para o Brasil do produto objeto desta Circular, e de dano à indústria doméstica resultante de tal prática, decide:

1. Iniciar investigação para averiguar a existência de dumping nas exportações da República Popular da China para o Brasil de calçados, classificados na Nomenclatura Comum do Mercosul - NCM nas posições 6402 a 6405, exceto aqueles classificados nos itens NCMs 6402.12.00, 6402.20.00, 6403.12.00 e 6403.20.00, e de dano à indústria doméstica resultante de tal prática.
1.1. A data do início da investigação será a da publicação desta Circular no Diário Oficial da União - D.O.U.
1.2. A análise dos elementos de prova da existência de dumping que antecedeu a abertura da investigação considerou o período de 1º de janeiro de 2007 a 31 de dezembro de 2007.
1.3. Tendo em vista que, para fins de procedimentos de defesa comercial, a República Popular da China não é considerada um país de economia predominantemente de mercado, o valor normal foi calculado com base no preço praticado em um terceiro país de economia de mercado. O país de economia de mercado adotado foi a Itália, atendendo o previsto no art. 7º do Decreto nº 1.602, de 1995.
Conforme o § 3º do mesmo artigo, dentro do prazo para resposta ao questionário, de 40 dias a contar da data de sua expedição, as partes poderão se manifestar a respeito e, caso não concordem com a metodologia utilizada, poderão apresentar nova metodologia, explicitando razões, justificativas e fundamentações, indicando, se for o caso, terceiro país de economia de mercado a ser utilizado com vistas à determinação do valor normal.

2. Tornar públicos os fatos que justificaram a decisão de abertura da investigação, conforme o Anexo a esta Circular.

3. De acordo com o disposto no § 2º do art. 21 do Decreto nº 1.602, de 1995, deverá ser respeitado o prazo de vinte dias, contado a partir da data da publicação desta Circular no D.O.U., para que outras partes que se considerem interessadas no referido processo solicitem sua habilitação, com a respectiva indicação de representantes legais.

4. Na forma do que dispõe o art. 27 do Decreto nº 1.602, de 1995, à exceção do governo do país exportador, serão remetidos questionários a todas as partes interessadas, que disporão de quarenta dias para restituí-los, contados a partir da data de sua expedição. As respostas aos questionários da investigação, apresentadas no prazo original de 40 (quarenta) dias, serão consideradas para fins de determinação preliminar com vistas à decisão sobre a aplicação de direito provisório, conforme o disposto no art. 34 do citado diploma legal.

5. De acordo com o previsto nos arts. 26, 31 e 32 do Decreto nº 1.602, de 1995, as partes interessadas terão oportunidade de apresentar, por escrito, os elementos de prova que considerem pertinentes.
As audiências previstas no art. 31 do referido Decreto deverão ser solicitadas até 180 (cento e oitenta) dias após a data de publicação desta Circular.

6. Caso uma parte interessada recuse o acesso às informações necessárias, não as faculte no prazo estabelecido ou impeça de forma significativa a investigação, poderão ser estabelecidas conclusões, positivas ou negativas, com base nos fatos disponíveis, em conformidade com o disposto no § 1º do art. 66 do Decreto n.o 1.602, de 1995.

7. Caso se verifique que uma parte interessada prestou informações falsas ou errôneas, tais informações não serão consideradas e poderão ser utilizados os fatos disponíveis.

8. Na forma do que dispõe o § 4º do art. 66 do Decreto no 1.602, de 1995, se uma parte interessada fornecer parcialmente ou não fornecer informação solicitada, o resultado poderá ser menos favorável àquela parte do que seria caso a mesma tivesse cooperado.

9. Os documentos pertinentes à investigação de que trata esta Circular deverão ser escritos no idioma português e os escritos em outro idioma deverão vir aos autos acompanhados de tradução feita por tradutor público, conforme o disposto no § 2º do art. 63 do referido Decreto.

10. Todos os documentos referentes a presente investigação deverão indicar o número do Processo MDIC/SECEX/DECOM 52100.006147/2008-44 e ser enviados ao Departamento de Defesa Comercial - DECOM, Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Esplanada dos Ministérios, Bloco J, sala 803,

Brasília, DF. - CEP 70053-900. Telefone: (61) 2109-7770. Fax: (61) 2109-7445.
WELBER BARRAL

ANEXO

1. Do processo
1.1. Da petição Em 30 de outubro de 2008, a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados, doravante denominada peticionária, ou simplesmente ABICALÇADOS, protocolizou no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior petição de abertura de investigação de dumping nas exportações para o Brasil de calçados, quando originárias da República Popular da China (China) e da República Socialista do Vietnã (Vietnã), e de dano à indústria doméstica decorrente de tal prática.
Em 4 de dezembro de 2008, após a análise das informações apresentadas, a ABICALÇADOS foi informada de que a petição estava devidamente instruída, em conformidade com o § 2º do art. 19 do Decreto nº 1.602, de 23 de agosto de 1995.
Em atendimento ao que determina o art. 23 do Decreto no 1.602, de 1995, os governos da China e do Vietnã foram notificados da existência de petição devidamente instruída, com vistas à abertura de investigação de que trata o presente processo, em 15 de dezembro de 2008.
Em correspondência protocolizada no MDIC em 24 de dezembro de 2008, a ABICALÇADOS solicitou a exclusão do Vietnã de sua petição.
1.2. Da representatividade da peticionária A indústria doméstica está representada pela ABICALÇADOS, apoiada por sindicatos das indústrias calçadistas do Brasil, que informou representar praticamente a totalidade da produção brasileira de calçados. Nos termos do § 3º do art. 20 do Decreto nº 1.602, de 1995, para fins da análise de abertura da investigação, considerou-se que a ABICALÇADOS possui representatividade para atuar em nome dos produtores nacionais de calçados.
2. Do produto objeto da análise, sua classificação e tratamento tarifário
2.1. Dos calçados
O produto é definido como artefato para proteção dos pés, construído com a parte superior em material natural ou sintético e a parte inferior em material natural ou sintético, voltado para o consumidor masculino, feminino ou infantil e destinado ao uso diário, social, ou esportivo.
Neste sentido, estão excluídos os seguintes calçados: a) de uso médico-hospitalar classificados em outras posições da Nomenclatura Comum do MERCOSUL (NCM) que não as de 6401 a 6405;
b) os destinados à segurança do trabalho (comumente classificados na NCM 6401); c) as sandálias praianas, confeccionadas em borracha e cujas tiras são fixadas ao solado por espigões (comumente classificadas na NCM 6402.20.00); d) os impermeáveis/ injetáveis (comumente classificados na NCM 6401); e) os destinados à prática de esqui e surfe de neve (comumente classificados na NCM 6402.12.00 e na NCM 6403.12.00); f) os de couro natural com a parte superior em tiras, e que encobre o dedo maior, popularmente designados alpercatas (comumente classificado na NCM 6403.20.00).
Segundo a peticionária, os calçados são produzidos com materiais naturais (couro, tecidos de algodão etc.) ou sintéticos (plástico, borracha, etc.) tanto na parte inferior quanto na parte superior, podendo ser usadas fivelas plásticas ou metálicas, por exemplo, pedrarias, enfim uma enorme gama de acessórios que agregam qualidade, valor e beleza ao calçado.
De maneira genérica, os calçados são divididos em duas partes principais: o solado (parte inferior que suporta o peso do usuário e entra em contato direto com o solo) e o cabedal (parte superior, conectada aos solados ao longo das suas bordas e que reveste os pés dos usuários). Esta divisão do produto estende-se para os processos de fabricação de calçados, ou seja, os processos de fabricação e sua divisão em módulos nas plantas de manufatura dividem-se em três categorias principais: fabricação de solados e palmilhas, fabricação de cabedais e montagem (que consiste da execução da união das duas partes supracitadas que compõem os calçados).
A ABICALÇADOS afirmou que, por se tratar de um produto de moda, e, portanto, objeto de incontáveis combinações de matériasprimas, não é possível distinguir as propriedades físicas de uma gama tão significativa de produtos.
Ademais, a Associação declarou que os calçados seriam substituíveis do ponto de vista do consumidor e da produção.
Desta forma, os calçados seriam substituíveis em função de sua utilidade, ou seja, a critério do consumidor diferentes tipos de calçados podem ser usados com uma mesma finalidade, independentemente da classificação fiscal da NCM em que este produto está enquadrado.
Ainda, sob o ponto de vista de produção são múltiplas as possibilidades de uma mesma fábrica produzir diferentes tipos de calçados, quando se considera o uso, a modelagem e os tipos de materiais empregados. A única restrição notável de mobilidade que existe seria com relação a uma unidade, que produza exclusivamente calçados injetados (costumeiramente classificados na NCM 6401) passar a produzir os demais tipos de calçados e vice versa. Nestes casos seriam necessários investimentos relativamente importantes para a complementação do maquinário, visto se tratar de calçados injetados, cuja característica é o capital intensivo.
Os calçados são usados, de um modo geral, para proteger os pés e lhes dar mais conforto ao caminhar. Há, contudo, aqueles específicos para prática de esportes e até mesmo aqueles utilizados para a segurança do trabalhador. Adicionalmente, podem se subdividir entre calçados para uso diário, para festas e situações especiais, onde se enquadram aqueles utilizados para práticas esportivas, os para segurança no trabalho, entre outros, que por sua vez podem ser novamente divididos entre calçados infantis e para adultos, femininos e masculinos.
A Associação também informou que tais produtos têm se destacado nos dias atuais muito além da suas simples facetas utilitárias, sendo item integrante e relevante do conceito de moda, nicho em que o Brasil vem paulatinamente se destacando pela agregação de qualidade e criatividade.
Para fabricação de solados e palmilhas são utilizados materiais poliméricos e aditivos (agentes vulcanizadores, estabilizantes e expansores) que, por meio de um beneficiamento, atingem a forma desejada pela aplicação.
Os principais beneficiamentos na fabricação dos solados e palmilhas são o corte dos materiais poliméricos com navalhas e a moldagem a quente com matrizes.
Para algumas aplicações, o material polimérico é previamente conformado por laminação formando placas planas. O material é então cortado por navalhas em formatos previamente definidos visando a sua aplicação na conformação de solados e palmilhas via processos de termoformado e prensagem.
Já a moldagem a quente com matrizes é o processo de transformação da resina polimérica em um produto acabado. Pode ser realizado por três processos distintos: termoformado, injeção ou prensagem.
Na fabricação de cabedais são utilizados tecidos naturais e sintéticos, couros, linhas, ilhós, fivelas, velcros, zíper, gáspeas de PVC, elásticos etc., e adesivos de preparação.
Os principais beneficiamentos na fabricação dos cabedais são o corte dos couros e tecidos com navalhas. Assim como ocorre nos processos de corte dos materiais poliméricos, o corte dos tecidos e couros é realizado com o uso de navalhas.
Os elementos que compõem os cabedais são fixados entre si via três mecanismos básicos: costura, soldagem por alta-freqüência e conexão por adesivos.
Na etapa de montagem são unidas todas as partes que compõem o calçado, resultando no produto final acabado. Além do cabedal, solado e palmilha, são utilizados ainda as palmilhas de montagem ou ensacados e adesivos. Os beneficiamentos estão relacionados às preparações necessárias para deixar o cabedal e o solado em condições de serem unidos.
O cabedal precisa ser fechado para que possa suportar a forma de montagem durante a etapa de fixação ao solado. Isso é feito utilizando uma palmilha especial denominada palmilha de montagem para os calçados femininos e de ensacado para os tênis.
A forma de montagem garante o tamanho e formato do calçado no momento da união com o solado. Além disso, serve como elemento estruturante, facilitando o processo de colagem das partes.
A montagem ainda consiste no processo de união do cabedal com a sola e pode ser dividida nas seguintes etapas: aplicação da substância adesiva; secagem das substâncias adesivas; reativação da substância adesiva; prensagem mecânica a vácuo; resfriamento forçado; extração da forma; e embalagem do calçado.
2.2. Do produto sob análise
O produto sob análise é o artefato para proteção dos pés, construído com a parte superior em material natural ou sintético e a parte inferior em material natural ou sintético, voltado para o consumidor masculino, feminino ou infantil e destinado ao uso diário, social, ou esportivo, normalmente classificado nas NCMs 6402 a 6405, com exceção daqueles classificados nas NCMs 6402.12.00, 6402.20.00, 6403.12.00 e 6403.20.00, importado da China. Os calçados importados da China possuem as características gerais apresentadas no item anterior.
2.3. Do produto nacional
O produto fabricado no Brasil, tal qual definido no item anterior, é o artefato para proteção dos pés, construído com a parte superior em material natural ou sintético e a parte inferior em material natural ou sintético, voltado para o consumidor masculino, feminino ou infantil e destinado ao uso diário, social, ou esportivo, normalmente classificado nas NCMs 6402 a 6405, com exceção daqueles classificados nas NCMs 6402.12.00, 6402.20.00, 6403.12.00 e 6403.20.00. Os calçados nacionais possuem as características gerais apresentadas no item 2.1.
2.4. Da similaridade dos produtos De acordo com as informações apresentadas na petição, o produto fabricado no Brasil possui as mesmas características dos calçados provenientes da China.
Ao se comparar o produto nacional e o importado, verificouse que ambos possuem usos e aplicações comuns, tendo sido constatado que os produtos concorrem no mesmo mercado, não havendo diferenças que impedissem a substituição de um pelo outro.
Assim, o produto fabricado no Brasil foi considerado similar aos calçados importados da República Popular da China, nos termos do § 1º do art. 5º do Decreto nº 1.602, de 1995.
2.5. Da classificação e tratamento tarifário
O produto em questão é comumente classificado nos capítulos 6402 a 6405, com exceção dos itens 6402.12.00, 6402.20.00, 6403.12.00 e 6403.20.00 NCM, conforme segue: 6402.19.00, 6402.91.10, 6402.91.90, 6402.99.10, 6402.99.90, 6403.19.00, 6403.40.00, 6403.51.10, 6403.51.90, 6403.59.10, 6403.59.90, 6403.91.10, 6403.91.90, 6403.99.10, 6403.99.90, 6404.11.00, 6404.19.00, 6404.20.00, 6405.10.10, 6405.10.20, 6405.10.90, 6405.20.00, 6405.90.00.
As seguintes NCMs de calçados não estão incluídas na análise:
6401.10.00, 6401.92.00, 6401.99.10, 6401.99.90, 6402.12.00, 6402.20.00, 6403.12.00 e 6403.20.00.
A alíquota do Imposto de Importação dos calçados sob análise é de 35%.
3. Da indústria doméstica Consoante o disposto no art. 17 do Decreto nº 1.602, de 1995, para fins de análise dos elementos de prova da existência de dano, considerou-se como representativo da indústria doméstica os dados da indústria calçadista constantes do estudo realizado pelo Instituto de Estudos e Marketing Industrial - IEMI junto aos produtores nacionais do produto objeto da análise.
4. Do alegado dumping Utilizou-se o período de 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2007, a fim de se verificar a existência de indícios de prática de dumping nas exportações da China para o Brasil do produto objeto da análise.
4.1. Do valor normal Tendo em conta que a China, para fins de procedimentos de defesa comercial, não é considerada um país de economia predominantemente de mercado, consoante o disposto no art. 7º do Decreto nº 1.602, de 1995, o valor normal adotado teve como base preços praticados para o produto similar em um terceiro país de economia de mercado.
O valor normal foi determinado com base no preço representativo pelo qual os calçados seriam vendidos no mercado interno da Itália, obtido a partir de faturas de quatro produtores italianos de calçados, conforme indicado pela peticionária.
Desse modo, o valor normal obtido na condição ex-fábrica e à vista foi de US$ 31,96/par (trinta e um dólares estadunidenses e noventa e seis centavos por par)
4.2. Do preço de exportação Foram apurados os preços médios ponderados das importações brasileiras de calçados da China, ocorridas entre 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2007, com base nas estatísticas oficiais brasileiras de importação disponibilizadas pela Receita Federal do Brasil (RFB) do Ministério da Fazenda, na condição de comércio FOB.
A peticionária forneceu cotações de despesa de frete da fábrica até o porto, bem como despesas portuárias, incorridas na China, possibilitando o cálculo do preço ex-fábrica.
Considerou-se que, para fins de abertura da investigação, não haveria prejuízo para os exportadores a apuração do preço de exportação sem dedução das despesas financeiras, as quais foram deduzidas no valor normal.
Obteve-se, assim, o preço de exportação de US$ FOB 5,97/par (cinco dólares estadunidenses e noventa e sete centavos por par)
4.3. Da conclusão do dumping Da comparação entre o valor normal e o preço de exportação, apurou-se a margem absoluta de dumping de US$ 25,99/par (vinte e cinco dólares estadunidenses e noventa e nove dólares por par), equivalente a uma margem relativa de 435,7%.
Tendo-se em conta a margem de dumping apurada, considerou-se, para fins de abertura de investigação, haver indícios suficientes da existência de prática de dumping nas exportações da China para o Brasil do produto objeto de análise.
5. Das importações
O período estabelecido para a análise das importações brasileiras abrangeu os meses de janeiro de 2003 a dezembro de 2007, segmentado da seguinte forma: P1. 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2003; P2. 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2004; P3. 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2005; P4. 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2006; P5. 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2007.
Na análise foram utilizadas as estatísticas oficiais de importação da RFB.
Observou-se que o volume das importações brasileiras originárias da China aumentaram em todos os períodos. De P1 para P2 o volume importado aumentou 88,1%, de P2 para P3, 90,2%, de P3 para P4, 3,3% e de P4 para P5, 71,3%. De P1 a P5, o crescimento acumulado das importações objeto de análise atingiu 533,4% ou 20.420 mil pares, tendo representado, em P5, 85,7% do total de calçados importados pelo Brasil.
Houve crescente aumento da participação das importações originárias da china no consumo nacional aparente durante o período analisado. Em P1 essa participação alcançava 1,%, 2,3% em P2, 4,3% em P3, 5,2% em P4 e 8,8% em P5.
Observou-se a progressão na relação entre as importações de produtos chineses e a produção nacional de calçados de P1 para P5, uma vez que a participação foi de 0,8% em P1, 1,5% em P2, 3% em P3, 3,6% em P4 e 6,7% em P5.
O valor CIF importado da China, aumentou 54,4% de P1 para P2, 71,2% de P2 para P3, 10,8% de P3 para P4, e 71,4% de P4 para P5. Ao longo do período de análise, o valor importado elevouse 402,1%.
O preço CIF foi calculado pela razão entre o valor total das importações em base CIF, em dólares estadunidenses, e a quantidade, em pares, total importada em cada período analisado.
Observou-se que o preço CIF médio ponderado das importações brasileiras originárias da China decresceu 18% de P1 para P2 e 9,9% de P2 para P3 . De P3 para P4, houve um aumento de 7,2% no preço CIF, e de P4 para P5 permaneceu no mesmo patamar.
De P1 para P5 o preço das importações chinesas apresentou redução de 20,8%.
Durante todo período de análise, o preço médio ponderado das importações brasileiras originárias da China foi inferior ao preço médio ponderado dos outros países, considerando-se a mesma condição de venda. Em P5, o preço médio ponderado chinês sob análise foi 58% menor que o preço médio ponderado dos outros países.
6. Do dano à indústria doméstica
O período de análise de dano à indústria doméstica foi o mesmo adotado na análise das importações.
Durante o período de análise do dano, a capacidade instalada e a produção da indústria doméstica foram decrescentes. O grau de utilização dessa capacidade aumentou de P1 para P2 e decresceu nos demais períodos. Esse aumento no grau de utilização ocorreu devido à redução da capacidade ter sido maior que a redução ocorrida na produção. Se comparado P5 a P1, observa-se redução de 8,2 pontos percentuais no grau de utilização da capacidade instalada.
As vendas internas da indústria doméstica foram decrescentes ao longo de todo o período analisado. Se comparado P5 a P1, observa-se redução de 28,5%. A participação dessas vendas internas no consumo aparente foi decrescente ao longo do período de análise de dano. Em P1, essa participação era de 98,5%; em P5, passou para 89,8%.
A análise conjunta dos dados do consumo aparente e das vendas da indústria doméstica mostrou que: (i) em P1, a indústria doméstica representava a maior parcela do consumo aparente (98,5%); (ii) em P5, sua participação foi reduzida para 89,8%; (iii) em P1, as importações chinesas tinham participação de 1,1% no consumo nacional aparente e em P5, essas importações representaram 8,8%; e, (iv) a participação das importações das demais origens também foi crescente ao longo de todo o período (em P5, a participação foi de 1,5%), embora o aumento acumulado tenha sido apenas de 1,1 pontos percentuais. Portanto, a queda da participação da indústria doméstica no consumo aparente deve-se principalmente ao aumento crescente da participação das importações originárias da China no mercado interno.
O estoque da indústria doméstica cresceu até P3, quando acumulou crescimento de mais de 40%, e reduziu 9,9% em P4. Em P5, comparativamente a P4, aumentou 4,5%. Se comparado P5 a P1, observa-se aumento de 35,3%. A relação do estoque com a produção também apresentou aumento ao longo de todo o período analisado:
em P1, a relação era de 2,3%; em P5, passou para 4,3%.
Os preços médios da indústria doméstica variaram ao longo do período analisado: de P1 para P2, houve redução de 10,3%; de P2 para P3, aumento de 4,3%; de P3 para P4, redução de 5,4%; de P4 para P5, aumento de 5,4%. Ao se comparar P5 com P1, observa-se redução de 6,7%.
Se considerado todo o período sob análise, a produtividade da indústria doméstica reduziu 10,9% e o número de empregados, 19,2%. A queda na produtividade ocorreu em razão da redução na produção (28,0% ao longo de todo o período) ter sido maior que a redução do número de empregados.
A receita líquida de vendas da indústria doméstica no mercado interno variou ao longo do período analisado, porém com tendência decrescente, pois ao se comparar P5 a P1, observa-se redução de mais de 33%. A redução na receita líquida foi decorrente principalmente da redução do volume de vendas e também pelas reduções do preço médio de vendas.
Convém lembrar que P5 foi o período que o mercado brasileiro recebeu o maior volume de importações chinesas do produto objeto de análise e o período que essas importações tiveram a maior participação no consumo aparente, tendo apresentado ainda o segundo menor preço de todo o período sob análise.
A análise da Demonstração de Resultados mostrou que a indústria doméstica trabalhou com margem negativa e prejuízo operacional de P2 a P5.
Da análise em conjunto dos dados concluiu-se pela existência de indícios de dano à indústria doméstica, tendo em vista que as vendas da indústria doméstica não acompanharam o crescimento do mercado brasileiro do produto objeto de análise, absorvido principalmente pelo produto importado objeto de dumping. Tendo em vista também que houve diminuição do volume vendido e produzido, redução da capacidade instalada e de seu grau de ocupação, redução de preço e de faturamento, queda no número de empregados e prejuízo operacional evidenciados no período analisado. Portanto, o comportamento desses indicadores mostra a existência de indícios de dano à indústria doméstica.
7. Do nexo causal
7.1. Da relação entre as importações objeto de dumping e o desempenho da indústria doméstica As importações da China para o Brasil do produto objeto de análise cresceram continuamente ao longo de todo o período analisado, de modo que em P5 o volume importado foi mais de 6 vezes maior que em P1. Já os preços médios dessas importações caíram de forma acentuada, acumulando uma queda de mais de 20% se comparado
P5 com P1. Em P1 essas importações chinesas tinham participação de 1,1% no consumo aparente nacional. Em P5, essa participação passou para 8,8%.
Observou-se que a concorrência com as importações chinesas exerceu papel expressivo na perda, pela indústria doméstica, de parcela significativa do mercado nacional em P5. Verificou-se que a indústria doméstica perdeu participação no consumo aparente em decorrência principalmente do aumento crescente da participação das importações originárias da China no mercado interno.
A análise dos indicadores da indústria em conjunto com os dados de importação mostrou que as importações chinesas foram responsáveis pela perda de participação da indústria doméstica no mercado nacional e pela redução das vendas, o que implicou na deterioração dos demais indicadores da indústria doméstica, tais como produção, emprego, preços e faturamento.
Face ao exposto, e levando-se em conta ainda que o produto importado se encontra subcotado em relação ao similar nacional, pôde-se concluir haver indícios de que as importações da China contribuíram significativamente para a ocorrência de dano à indústria doméstica.
7.2. Da avaliação de outros fatores Nessa etapa da análise não foram obtidas informações que permitam inferir que ocorreram mudanças no padrão de consumo nem a adoção de evoluções tecnológicas que pudessem resultar na preferência do produto importado ao nacional.
No que se refere às alterações no imposto de importação aplicado a calçados, em 01/01/2004 houve redução de 1,5 pontos percentuais na alíquota do imposto de importação para algumas das NCMs presentes nesta análise, o que teria justificado a redução dos preços da indústria doméstica nesse período.
Em agosto de 2005 e setembro de 2007 houve aumento de algumas alíquotas. Portanto, os sucessivos aumentos das importações analisadas a partir de P3 (2005) não podem se atribuídos às alíquotas de importação. Verificou-se que o aumento das importações do produto chinês superou o de outros países o que mostra que o imposto de importação não exerceu influência no avanço do produto chinês no mercado brasileiro.
A análise dos dados mostrou que o dano causado à indústria doméstica não pode ser atribuído às importações das outras origens, pois a participação dessas origens no consumo aparente, apesar de também ter sido crescente ao longo de todo o período, foi de apenas 1,5% em P5, período de maior participação, tendo acumulado aumento de 1,1 pontos percentuais de P1 a P5.
As vendas externas da indústria doméstica foram decrescentes a partir de P2. Se considerado P5 em relação a P1, essas vendas caíram 27,1%. Observou-se que a redução das vendas externas contribuiu para parte da diminuição da produção, redução do emprego, aumento do grau de ociosidade e elevação dos estoques de calçados da indústria doméstica. No entanto, cumpre ressaltar que, de P1 para P5, a redução do volume das vendas externas foi inferior à redução das vendas internas e que as vendas externas da indústria doméstica tiveram representatividade inferior a 36% do total de vendas da indústria doméstica. Assim sendo, não há que se considerar as vendas externas como fator impeditivo ao aumento das vendas internas.
Destaca-se, ainda, a aplicação de direito antidumping pela União Européia nas importações de calçados chineses.
Dessa forma, não foram identificados, para fins de abertura de investigação, outros fatores além do aumento das importações chinesas que pudessem estar contribuindo para o dano causado à indústria doméstica.
7.3. Da conclusão do nexo causal Considerando que as importações objeto de dumping cresceram continuamente, em termos absolutos, em relação ao total importado e em relação ao consumo nacional aparente; considerando-se que os preços médios dessas importações estiveram subcotados, em nível CIF internado, em relação aos preços médios de venda da indústria doméstica; e, considerando que não foi detectado nenhum outro fator que pudesse ser classificado como causa relevante do dano à indústria doméstica; conclui-se, para fins de abertura de investigação, que há elementos de convicção suficientes de que o dano à indústria doméstica decorreu, notadamente, em razão dos volumes e dos preços, de dumping, do produto importado da China.